Dentro de mim habitam muitos mundos…
QUERO TUDO!
Talvez numa tentativa de completude?
Preencher o vazio da existência encarnada?
“Não se pode ter tudo!”
Nessa de querer demais me disseram louca, vadia, bruxa, desvairada…
Eu só queria ser…
Com audácia fui e tento seguir sendo.
O sangue vem para mostrar o caminho…carrega, sonhos, conhecimentos, memórias…
Mergulho profundo em minhas vísceras.Vejo, sinto, choro, crio…
Sublimo minhas dores em arte, encontros, ciência e VIDA!
Tanta vida que transbordo e multiplico, agora sou dois ou três..quantos já nem sei.
Desde que meu corpo foi habitado por outra vida…Mudei… COM.PLE.TA.MEN.TE!
Fui tão completa que deixei de ser quem era… aquela movida pelo vazio.
Agora sou movida por outra existência que não a minha..por um amor nunca sentido antes.
Forte isso!
Nada fácil, nem romântico. Difícil para uma BU.CE.TA!
Cuidar..criar..guiar..guardar..
É revirar a própria história, as dores, alegrias, angústias e inseguranças..sentir tudo em dobro.. triplo..
O corpo esguio, livre e guiado pelo próprio desejo, egocentrado que só, dá lugar a um corpo sobrecarregado e exausto que, entretanto, descobre novos prazeres, poderes e forças onde nem imaginava, SÓ para servir a outrem.
Parece escravidão e talvez seja..
Não pelo ofício em si… mais pela forma na qual nossa sociedade se organiza e se beneficia deste sacrifício. SACRO.OFICIO.
Precisa uma aldeia inteira para criar uma criança!
Cadê?
A barriga que se esticou toda para caber um universo hoje carrega as marcas do estiramento.
Flácida, fora de forma, buscando os caminhos para voltar ao que era.
É possível voltar?
Os seios pequenos e empinados agora grandes, caídos e elásticos, ainda vertem leite…
Não é possível voltar ao que era!
Seria como querer reviver os mortos…
E a gente sente o LUTO…
Pra viver tem que morrer..o sangue ensina isso!
Uma parte sua se foi e vive agora na memória. E o que é o FIM se não o COMEÇO?
Ouroboros. ♾️
No espelho a imagem busca aceitação, não só do que vê por fora, mas também do que vê por dentro.
Que saudade de si, de dormir, do ócio, do que foi…
Apesar de ser TÃO BOM poder estar com essa nova vida e ver ela crescer e florescer.. sentir esse tamanho de amor.. ver o encantamento por cada coisinha dita “insignificante”.
É mesmo precioso poder descobrir o mundo através do olhar de uma criança. PRE.CI.O.SO!
Abnegação!
Não é mais sobre EU..é sobre NÓS!
NÓS sem anular o EU, e que transforma esse EU em imensidão.
É a gota que deságua no oceano!
E eu lá sei ser tudo isso?
Tô aprendendo a administrar essa complexitude.
De cá, de dentro, os muitos mundos que me habitam estão contemplando orgulhosos…
“Não se preocupe, você não nos perdeu e, ainda, há muito para encontrar!”
A vida é um sopro e ao mesmo tempo é cumpriiiiiida…
E o que ela quer da gente é CORAGEM!
Janaina Morais é antropóloga e educadora menstrual, Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais (UFJF). Atualmente, desenvolve uma pesquisa de pós-doutorado, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), vinculado ao Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri), da Unicamp, intitulada: “Educação menstrual nas escolas: impactos e desafios na promoção da dignidade menstrual”, com etapa de investigação no México, vinculada à Universidad Autónoma Metropolitana.
Revista Sangro
Labirinto, Labjor, Unicamp
Junho de 2025