Seminário temático na ReACT: vazantes de menstruações diversas

Em todo o mundo pessoas menstruam. No entanto, menstruar não é um denominador comum: não se menstrua do mesmo jeito e nem sempre harmonicamente. Em todos os lugares existem mulheres menstruando, mas também existem aquelas que não menstruam. Devemos nos lembrar também dos homens que menstruam, das pessoas não-binárias e intersexuais. Tematizar a menstruação nas Ciências Sociais nos obriga a trazer o corpo para o debate, desafiando os essencialismos de gênero. Na oitava edição da Reunião de Antropologia da Ciência e Tecnologia, debatemos as possibilidades da menstruação no Seminário Temático “Sangue, Técnica e Multiplicidade: vazantes de menstruações diversas”, que ocorreu entre os dias 23 e 26 de novembro, em quatro seções.
Em uma iniciativa engajada de diálogo entre a etnologia e a antropologia da ciência e estudos de gênero, as professoras Daniela Manica (Unicamp) e Luísa Elvira Belaunde (UNMSM – Lima, Peru) propuseram este espaço que permitiu que dezessete trabalhos de pesquisadoras/es de mestrado e doutorado de universidades públicas brasileiras, da Colômbia e do Peru fossem apresentados. Os trabalhos discutiram temáticas importantes para etnologia como o resguardo das mulheres menstruadas, rituais de menarca, a relação entre a menstruação e a lua. Para tanto, se reconhece a multiplicidade: fatores como tempo, ciclo, presença de cheiro, a cor, a temperatura, os instrumentos e técnicas para o cuidado de quem menstrua são agentes importantes para a fabricação do gênero.
Do ponto de vista da antropologia da ciência e dos estudos de gênero foram abordadas as tecnologias materiais e biotecnológicas que inscreveram o cissexismo nos corpos de mulheres cisgênero, como a pílula anticoncepcional, aplicativos de monitoramento do ciclo menstrual para smartphones, a experiência estigmatizada de menstruar na escola e também banheiros públicos, que resultam em vazios rituais para aquelas/es que estão sujeitas/os ao capitalismo tecnocientífico. Há ainda a demanda por entender a menstruação como uma experiência de conhecimento e contemplação de emoções particulares, nem sempre limitadas somente ao corpo ou só como as sociedades se organizaram diante da idiossincrasia das pessoas com ciclo. Diante dos atuais debates na esfera pública, também discutimos o tema da “pobreza menstrual”, questionando as origens do termo e que tipo de alteridades estão sendo produzidas por diferentes atores ao pautarem o assunto (da indústria farmacêutica, passando por legisladores e movimentos feministas de distintos espectros).
Conectar as duas áreas do conhecimento através da menstruação coloca o desafio de fazê-lo sem criar grandes generalizações, sem desconsiderar as especificidades, sem fazer essencialismos, sem abrir mão da etnografia. Tal tarefa reconhece a necessidade de superar maniqueísmos, assumir o contraditório e o ambíguo nas relações humanas para levantar o paradigma do cuidado menstrual como uma necessidade das mulheres cis gênero, homens trans e pessoas não binárias. Nos coloca na posição de desafiar o cissexismo, a branquitude, o feminismo liberal e a romantização da menstruação para construir alianças para um futuro possível alternativo ao capitalismo tecnocientífico.

 

 

Crédito da imagem: Foto autoral da pesquisadora Janaina de Araujo Morais.

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